despedida


me despeço
sem esperar
fecho a porta
sem me importar
fingindo querer
sem querer
até que a memória
o pudor a rotina
revelem
que tua boca
não é minha sina


se me falha a razão
busco
no lapso da memória
o motivo para a dor
poesia e solidão
se me falha a razão
conto
de trás pra frente
todos os dias que me
levaram da tua boca
ao rés do chão

se me falham os sentidos
justifico
esta pena que sigo
na certeza do espelho
cada palavra é reflexo
do querer e do desejo
se me falham os sentidos
minha vergonha
teu embaraço
criam abismo
que nem o passo mais altivo
suas viagens
meus livros
conseguem superar

se me falham
os sentidos
a memória
a razão
tiro a máscara da mulher forte
moderna
sem coração
que chora o leite derramado
a vertigem
a calma
poesia e solidão



sorvendo deste vinho
tinto
aqueço a noite escura
que paira do lado de dentro
mando embora
com o vento frio
todo sorriso entre dentes
toda calma premente
reinventando o sabor
frutado meio cítrico ou amargo
deste vinho
reinvento também
o arrepio

fizeste dos meus anseios
escada pros teus desejos
sem pudor ou cautela
me fiz escrava
cativa na tua cela
algemei os punhos
ignorei os sussurros
da razão
inventei castelos
fantasias de era uma vez
tendo a floresta como sombra
de repente da calma
fez-se a penumbra
e me vi só
acorrentada
numa prisão

o que fazer do presépio que anda vazio?
será que ele tem um furo
por onde os sonhos escapam?

o que fazer do corpo
que deixou de querer?
o que fazer da noite
que deixou de acalentar?

o que fazer dos dias
que só passam?

o que fazer das perguntas
que não cessam?

não houve resposta
nem brado ou estribilho

o vento é a dádiva
que passa e não resta dúvida
ou saudade

cedo ou tarde
o vento passa por aqui

privacidade

não invada meu silêncio
me deixe sozinha
não repare meus olhos fundos
cravados na face
eles são meus

não pense sobre mim
tampouco interrompa meu sono
não é um repouso justo
mas é meu

não faça perguntas
não com palavras
não sem elas

me deixe bastar
me deixe restar
me deixe quedar oculta
me deixe cantar a mesma música
me deixe sofrer a mesma dor
a minha dor

não se incomode
não me incomode
não me toque

não invada meus pensamentos
não demarque sua área
à minha volta
não faça território
nem plante bandeira

se deixe assim
longe de mim

a minha maneira é esta.