quando sobram coisas
e falta vontade
que ainda no peito bate
e dói
eu digo: mais tarde
e tarde em fazer
e tarde em chorar
e tarde o amor veio dizer
não dá.

corpo adentro


experimento
um a um
todos os sentimentos
o que não conheço
invento

corpo adentro
enfrento os maiores dilúvios
decido se e quando
me iludo

dou com a cara
no muro
dou a cara a tapa
pro mundo

e mudo a festa
a fantasia o carnaval
mudo o amor de lugar
a casa a mesa posta

o que resta
não importa

gelo


se digo que não ligo
uma parte de mim esmorece
e não consigo mais
(não contigo)
e perco o gosto do teu gosto
e teu gesto
tato

pois o que não faço
com vontade
e todo ímpeto exagerado
do que acredito verdade
não motiva e nem anima
engasgo

a frieza e indiferença
de mim não fazem parte
uma e outra
aqueço no rol dos apelos
descarto
jazigo de maus presságios

quando teu corpo
se contenta com o meu
morno
não faço alarde
desfaço o querer dos olhos
pela metade

se é pra ser gelo
ou tranquilo
sei o que de fato quero:
nem isto nem aquilo


é preciso de um tempo
pra discernir com clareza
a real natureza
do sentimento

a agrura ou alegria
a felicidade ou tormento
do que se vive
varia

a dor da incerteza
o ardor do tesão
a espera:
talheres
postos sobre a mesa
a noite
fria sobre o colchão

de tudo e para tudo
se pede ao tempo:
-tempo
sobre ti recai a decisão

se amadurece
e espera colher
ou se maduro
cai
e apodrece
no chão