Cegueira
Não vi teu amor virar-me as costas
Não vi por acaso
Ou de propósito
Não vi quando estive
Com minhas pernas enroladas ao
Teu corpo
Quando vivíamos de gozo e ócio
Não vi a mensagem que não mandaste
Nem a que mandou
Dizendo que viria
Não vi minha vida do avesso
Por perceber mais uma vez que dormias
E eu tentava esgueirar-me de ti
Enquanto ainda podia
Imagem de Henn Kim
Não vi por acaso
Ou de propósito
Não vi quando estive
Com minhas pernas enroladas ao
Teu corpo
Quando vivíamos de gozo e ócio
Não vi a mensagem que não mandaste
Nem a que mandou
Dizendo que viria
Não vi minha vida do avesso
Por perceber mais uma vez que dormias
E eu tentava esgueirar-me de ti
Enquanto ainda podia
Imagem de Henn Kim
Covarde
Estou com as portas fechadas
A sala vazia
A casa deserta
Estou com as mãos atadas
Os olhos cerrados
A alma encoberta
Por todos os lados
Só vejo palavras
Que julgam
E não falam:
Se escondem covardes
Por trás da sua
Verdade
Meu amuleto
É o silêncio.
*Imagem de @lucy_campbell_art
Não soube ler teus olhos
Nem a voracidade do teu desapego
Não soube entender teu desatino
Nem tua fome repentina pelo ermo
Não soube conter tua fuga
Nem medir o espaço da despedida
Não soube o tempo exato
Que te fez decidir pela partida
Não soube de tuas chegadas
Nem soube das vezes que disse:
Eu vou - e nunca ia
Não soube ouvir teu silêncio
Quando urgia
E mesmo quando os espaços
Entre os vãos aumentavam
E os retalhos rotos dos nossos corpos anunciavam: fim
Ainda havia algo de destino
Vagando feito verso errante
Como que acordando de
Um sono diletante
Ainda soube dizer a vontade
Que me cabia
Soube ser, querer e estar
Soube ser inteira para completar
Soube ser areia
Para tudo que era mar
*Imagem de Daria Hlatzova.
De longe
Certa vez ouvi tocar
Da rabeca uma canção
Que fez minha mente admirar
E emocionar o coração
Suas notas tão singelas
Sua lapela
Seu condão
Os contrastes evidentes
Entre o som, a rima e o pendão
Nunca mais ouvi um som
Tão pungente
Tão loquaz
Que tirasse da madeira
A matéria capaz
De reviver alegrias e
Tormentos
Na memória jaz
Todo o sentimento
Natureza de sol, ar e vento
Melodia que fez morada
Fez abrigo
Fez estada
No meu alento
*Imagem de Faiza Maghni
Casa
Essa história de uma vida
inteira
Traz coisas pra contar
Algumas menos
Outras mais faceiras
Mas todas constroem
Esta vida
Este corpo: meu lar
De lá pra cá
Coisas outras surgem
Ideias de idas
E vindas
Passagens de outro lugar
As memórias que habitam
Minha casa-corpo
Lembram:
A vida se vive somente
Pelo que há de vir
adiante
Meu futuro, decerto incerto
Começou de mãos dadas
Com a liberdade por perto
Sem medo de voar
Arrisco: me jogo rasante
Contigo
Outros amores seguem
Seu rumo
E deixam a casa limpa
Posto vazio
Pro teu amor morar
Segredo
Me diz a palavra
Que toca teu
Corpo
Me diz a palavra
Que fecha teus
Olhos
Ofusca feito ouro
Me diz a palavra
Que fere tua existência
Me diz qual apelo
Aguça
Qual sinal
Atiça
Qual nome
bagunça tua cabeça
Me diz
Qual pele te enleva
Qual pelo te roça
Me diz qual olho
Te olha mais
Fundo
Me diz o que cabe
(Será que me cabe)
No teu mundo
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